terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Contos do Vestido Preto II

À medida que conduzia, a mesma pergunta ressoava: Seria capaz de o reconhecer?
E se não conhecesse? Não seria isso bom? Não seria isso uma mostra da sua indiferença? Ou seria apenas mais uma arma para construir a fantasia? Nas avenidas, os semáforos altos pareciam pender do céu, a chuva tornava tudo desconexo. Os pensamentos atabalhoados sucediam-se, e se se perdesse? E se não conseguisse lá chegar? Nos últimos tempos, todos os planos que fazia eram contrariados, sempre que pensava que tinha desistido dos planos, via uma intenção contrariada. Seria, afinal, possível viver sem planear? Sem desejar? Sem esperar? Era esse o maior desafio que tentava superar.
À medida que conduzia por caminhos que não conhecia, mas que já não a assustavam, lembrava-se de todas as vezes que tinha equacionado o suicídio. Não sabia dizer se o tinha ponderado de forma consciente, achava que sim. Era recorrente o pensamente de guinar o volante contra um qualquer separador central, puxar o travão de mão, acelarar de olhos fechados. Talvez o melhor fosse não chegar. Talvez o melhor fosse não se despedir. Talvez o melhor fosse não tirar nunca mais o vestido preto.

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